quarta-feira, 25 de julho de 2012

"As pessoas pensavam que ninguém iria superar os Beatles. E então chegou Michael Jackson."

Uma retrospectiva da vida em turnê com Michael Jackson, por Bryan Matthews

Michael Jackson era um artista consumado, que sabia exatamente como organizar um show e colocar o público a seus pés.
As equipes de produção tiveram a experiencia de conhecer como era realmente a vida de Michael Jackson. Os técnicos de iluminação Peter Morse, Jim Waits, Benny Kirkham e Gregg Brooks compartilharam o trabalho com Michael, uma perspectiva única sobre o Rei do Pop.

“Eu era o designer de iluminação na ‘Dangerous’e ‘HIStory’ tours e também em ‘Michael Jackson and Friends”, conta Peter Morse. “Eu tinha trabalhado com o empresário de Michael há alguns anos, por isso, quando me ligaram, claro que eu disse que sim.” “Eu estava animado porque, tecnicamente falando, Michael é um sonho para um designer de iluminação. Não havia barreiras ou limitações com ele, e mesmo quando algumas de suas idéias nos parecia remotamente estranhas, nós encontrávamos uma forma de realizá-las. Era o tipo de artista com o qual se poderia chegar tão longe quanto você quisesse para alcançar um efeito, não ainda o Eclipse, mesmo que servisse apenas para apoiar o que estava sendo feito. Ele tinha essas idéias estranhas e maravilhosas que eu não sabia como atingir tecnicamente, mas conceitualmente sabia no que resultaria. Ele pedia coisas de uma forma simples, mas que requereriam vários desafios tecnológicos".

“A primeira coisa que eu fiz com o Michael foram shows do Jackson 5 no final dos anos 70 e a próxima vez, quase dez anos depois, em 1987″, disse Jim Waits. "Foi sua primeira turnê solo, Bad, que veio depois da Victory Tour. Eu era o programador de Vari-Lite e era o chefe de sua equipe técnica".

“Comecei com Michael na HIStory Tour, na primavera de 1996", diz Benny Kirkham. “Enquanto eu estava trabalhando para Vari-Lite quando Jim Waits recomendou meus serviços para o show. Usamos todos a iluminação clássica VARI * LITE para a turnê, tais como: VL2C, VL4, VL5, Washington e VL6. Meu trabalho consistia em colocá-las todos os dias".

“Quando Jim Waits me chamou pela primeira vez, eu estava nos Jogos Olímpicos de Atlanta. Fazia muito calor, então quando ele me ligou para me tirar de lá e fazer uma tour com Michael Jackson, eu adorei", disse Gregg Brooks. “Foi ótimo porque era minha primeira turnê. Benny e eu trabalhamos juntos com técnicos da Vari-Lite levando toda a iluminação."


“Todo artista é diferente”, continuou Morse. “Alguns artistas não se envolvem na iluminação do show e outros nem sequer sabem o seu nome. Outros envolvem-se amplamente. Alguns sabem o que estão falando e outros não. Michael podia não saber o que estava pedindo tecnicamente, mas artisticamente, em sua mente, ele sabia o que queria. Às vezes, ele dizia, ‘eu posso ter bastante luz branca aqui?’ Ou "Posso ter uma luz branca na minha cabeça?" “E é claro que nós fazíamos o possível para que isso acontecesse. Eu cheguei ao ponto de poder adivinhar o que ele queria, pois sabia o que ele estava pensando sobre a questão da iluminação. A beleza da nossa relação de trabalho era que eu poderia atingir as profundezas da minha imaginação e eu sabia que não estava indo longe demais. Nada era estranho demais para ele.

“Michael era diferente de qualquer outro com quem eu trabalhei”, diz Waits. “Ele estava totalmente envolvido, mas não necessariamente desde o início. Esperam que todos estivessem sentados e aí fazia as mudanças, ou pedia para acrescentar algo. E pedia rapidamente. No primeiro dia de ensaios, me pediu para programar tantos efeitos de luz quanto eu pudesse, e cheguei a fazer uns 140 antes que Michael estivesse pronto para ver o que tínhamos. Depois de ver todos eles e depois de uma breve conversa, o designer de iluminação me informou que Michael queria usar todos eles em cada canção. Então aprendemos que, talvez, deveríamos ensinar a ele apenas um pouco de cada vez."


“Todo mundo quer saber como ele é realmente”, afirmou Kirkham. “Eu encontrei com ele algumas vezes e foi muito profissional e eu o achava muito inteligente. No final da turnê HIStory posou para fotos com toda a equipe, não foto de todo o grupo, mas fotos individuais. Gregg e eu temos essa foto com Michael pendurada na parede e todo mundo pergunta a mesma coisa: É real? E isso é exatamente o que Michael era, era autêntico".

A turnê nacional é uma jornada longa e difícil. Uma turnê internacional é ainda mais longa e mais intensa. Se você acrescentar a isso o fato de que você está viajando com um dos artistas musicais mais populares do mundo, pode ter uma ideia. A vida em turnê com Michael Jackson foi dura, mas também cheia de ótimas lembranças.

“Michael sempre foi muito focado na apresentação do show em si”, diz Morse. “Isso significava tecnicamente, musicalmente e em todos os outros aspectos do desempenho. Mas havia sempre uma parte específica do concerto dedicada ao seu desejo de curar o mundo de uma forma em que ele ou sua música pudessem fazê-lo. A turnê Dangerous foi realmente sua primeira declaração focada em ‘Heal the World e Curar as Crianças’. Estava sempre subentendido e efetivamente era uma parte do show. Percebi que a reação das pessoas era sempre a mesma, onde quer que ele fosse. Em muitos lugares, os fãs não sabiam falar uma palavra de Inglês, mas eles sabiam as letras de todas as músicas. Você pode sempre ouvi-los cantando em coro. Era fenomenal. No concerto televisionado de Dangerous em Bucareste, Romênia, a absoluta imensidão da audiência era obvia. Fiz tour com com artistas como Madonna, que tiveram 100.000 a 200.000 pessoas em um estádio, aquela era a maior multidão que eu já vi. Rodeavam todo o estádio e alguém disse que era a maior multidão desde a revolução. Estávamos um pouco nervosos com a presença do exército, mas o nervoso desapareceu quando as pessoas começaram a cantar em coro. Eu não sei como o viam pessoalmente, mas Michael foi definitivamente um tipo de Flautista de Hamelin ou um messias diante de seus olhos. Ele defendia o amor para o mundo todo e eu acho que eles (fãs) rapidamente perceberam isso".


“Quando fui ao Japão pela primeira vez com Gênesis e passeava com a banda em templos, tirando fotos, era como um passeio em família.” Waits disse. “Mas se você fosse ali com Michael Jackson e ainda usasse uma jaqueta com o logotipo da turnê, seria literalmente esmagado. Você poderia ser um total estranho, mas se estiver associado com a tour, já seria alguém. É um pouco preocupante do meu ponto de vista. Algumas pessoas gostam, eu e outros como eu, tentamos escapar. Levei várias camisetas lisas para usar em público".

“Em 1988, um ano antes da queda do Muro de Berlim, atuamos no Reichstag, o antigo Parlamento”, continua Waits. "Concertos foram realizados no espaço que havia na frente e poderia acertar uma pedra no muro de onde estávamos. Nós colocamos luzes e som extras para que as pessoas pudessem ver e ouvir do outro lado. Disseram que o público nas ruas do outro lado era dez vezes maior do que o que tínhamos ali em frente, e que o espaço estava completamente ocupado. Foi um dos momentos mais memoráveis de que eu fiz parte e estar com Michael Jackson o torna ainda mais memorável".



Kirkham acrescentou: “Na nossa turnê, Michael foi definitivamente um embaixador internacional da paz. Tivemos alguns momentos incríveis nos shows. Tinhamos uma cena de uma cidade enorme bombardeadas com fumaça saindo dos edifícios destruídos. A população local se misturava com os dançarinos e, em seguida, cantavam Earth Song. O refrão dizia “E quanto a nós’” e no final da música uma luz cegante e um tanque surge do fundo do palco. Era um tanque verdadeiramente único e Michael parava na frente dele, como se fosse na Praça Tiananmen. O motorista do tanque pulava apontando uma arma para Michael. Ele estendia a mão e baixava a arma, deixando o soldado oprimido pela emoção e, em seguida, uma garota local se aproximava do soldado e dava-lhe uma flor. Depois entravam as bandeiras de todos os países do mundo, enquanto tacava ‘Pictures at an Exhibition’ com tambores enormes, os dançarinos e artistas agitavam as bandeiras enormes de todos os países por volta dos que faziam a turnê. Foi extraordinário. Não se pode subestimar a popularidade que Michael tinha e tem, não importa onde fossemos, e fomos a países da Europa Oriental, onde poucos anos antes haviam tanques nas ruas. As pessoas se emocionavam em todo o mundo e esta é uma recordação que terei comigo para sempre".


“Existem grandes recordações da turnê com Michael”, diz Brooks. “Um dos mais importante é que fizemos muitos shows na chuva. Lembro-me de uma noite miserável na turnê da Ásia, enquanto carregávamos o material e pequenas mulheres asiáticas nos deram uma mão. Faziam um grande esforço para empurrar com a rampa molhada as enormes caixas VL2C enquanto chovia fortemente. Era uma espécie de aviso de que não estávamos no Kansas, mas trabalharam tão duro como qualquer outro membro da equipe que tínhamos na turnê e nunca as esquecerei".

“Estou orgulhoso de ter trabalhado para uma pessoa que, você pode dizer, era um profissional consumado todos os dias”, diz Kirkham. “Michael Jackson trabalhava tão duro quanto qualquer outro na turnê. As pessoas vêem a simplificação de sua vida na mídia, mas eu sei que era um bom chefe e eu sei que era um artista incrível. Depois da minha experiência pessoal, pude ver centenas de concertos, posso provar o que digo".

“Eu realmente gostei de trabalhar em turnê com Michael Jackson, mas nunca me qualifiquei como um fã e nunca comprei nenhum de seus álbuns, mas quando eu soube de sua morte algo dentro de mim me fez sentir como se tivesse perdido alguém próximo” , confirmou Brooks. “Eu não sei explicar, mas fiquei surpreendentemente alterado”.

“A lembrança que terei sempre de Michael é a primeira reunião que tivemos para discutir idéias sobre a Dangerous Tour”, diz Morse. “Encontrei em Michael a pessoa mais carinhosa e divertida que eu já conheci, nada a ver com a imagem pública que os outros viam. Contava grandes histórias cheias de piadas sobre seu passado e era extremamente simples. Minha primeira conexão com ele, eu disse que era acessível e definitivamente tinha uma boa visão para as coisas grandes, não só sua carreira, mas também para os seus shows. Era uma pessoa criativa por isso era um sonho se tornando realidade para um designer de iluminação".


Morse continua: “Um dia durante os ensaios, Michael estava pronto para ensaiar o número de abertura e saiu catapultado no que chamamos de torradeira, voando a partir de um buraco e aterrissando em ambos os pés. Ele estava com o icônico traje de metal, com óculos escuros e cabelo comprido, com um olhar fixo, duro e distante. No primeiro dia, fez isso com cerca de 50 pessoas na equipe e bailarinos assistindo apenas, ficou lá por cerca de quatro minutos. Nós nos entreolhamos nervosamente nos perguntando o que ele estava fazendo. Então, ele lentamente levantou sua mão, pegou os óculos e os tirou. Pareceu durar uma eternidade e, em seguida, rapidamente se virou e começou a música. Claro que eu me perguntava por que ele fazia essa longa pausa. Bem, a razão é que ele sabia exatamente quanto tempo necessitava manter esta pose para o público. A primeira vez que ele fez ao vivo no Estádio de Munique, a pausa era exatamente do mesmo tempo que nos ensaios e a multidão foi à loucura. Ele sabia disso".


“Dirigir a iluminação para um concerto de Michael cada noite com a multidão que tínhamos e os lugares onde estávamos era muito impressionante”, diz Kirkham. “Uma turnê sempre acaba sendo rotina, de qualquer maneira. Com o tempo, qualquer coisa pode tornar-se normal, mas o extraordinário era ter uma multidão daquele tamanho. Eu acho que em Varsóvia havia cerca de 400.000 pessoas no show. No papel é simplesmente um grande número, mas só quando você vê 400.000 pessoas em um único lugar, realmente pode perceber a enormidade que isso é".

“Em uma turnê com Michael definitivamente se trabalha com uma equipe de ponta” continua contando Kirkham. “Eu lembro que havia um outro par de turnês naquele ano, mas sentíamos que estávamos trabalhando com algumas das melhores pessoas neste negócio. E você sempre sabia que podia confiar nos colegas ao seu redor. Todo mundo se esforçava para fazer seu melhor. Era extraordinário. Era um trabalho muito duro e havia dias em que você realmente odiava a vida. Saímos por sete meses consecutivos e corremos todo o mundo. Nos sentíamos infelizes às vezes, mas no final, nos olhávamos uns aos outros e percebíamos que tínhamos realmente feito algo grande".

“Enquanto nós estávamos em turnê, eu lembro de ter pensado como era quando você olha para trás desde a época dos Beatles”, diz Brooks. “Sempre assisto histórias de milhares de fãs gritando quando eles vieram pela primeira vez para a América, e sair em turnê com Michael era muito semelhante. Foram duas turnês diferentes com o mesmo título. Na primeira parte, voamos para o leste para o primeiro concerto em Praga e aterrissamos alguns meses mais tarde, em Los Angeles para ir para o oeste. Literalmente voamos ao redor do mundo e pisamos em cada um dos continentes, exceto a Antártida. Essa parte da turnê foi muito tortuosa. O trabalho era às vezes doloroso, mas depois tivemos uma pequena pausa, a produção limpou as coisas um pouco e a segunda parte foi uma turnê normal pela Europa. Tornou-se maior com o tempo. Tínhamos um verdadeiro grupo que estava a bordo cada noites e tornou isso possível".

“Quando eu olho para trás, em uma retrospectiva da vida e da carreira de Michael Jackson, uma das coisas que se destaca para mim é que com toda a sensibilidade que eu tinha e da grande elegância natural para o envolvimento tecnológico, eu jamais pude desfrutar de uma turnê totalmente instalada com iluminação automática", disse Morse. “Haviam me falado de quão grande seria a turnê planejada, mas infelizmente não aconteceu. Michael era mais que um cantor / compositor, era um artista, o artista ideal. Se você nunca se sentou em um estadio com 400.000 fãs gritando e esperando para ver qual o próximo movimento que você fará, você não pode imaginar a magnitude e a profundidade de sua vida e as milhões de pessoas a quem ele inspirou".

Waits concorda: “É difícil”. Toda vez que penso sobre a vida e a história de Michael Jackson, o maior com quem trabalhei. E acima de tudo, Michael estava realmente lá para tudo. Minha última turnê com Michael foi a última para mim e uma boa maneira de terminar, porque eu sabia que depois de trabalhar com Michael e a grande equipe que reuniu, eu não iria fazer nada melhor. Foi um bom momento para terminar essa parte da minha carreira".

“Acho que ele vai ser bem lembrado e a controvérsia em torno de sua vida irá diminuir”, diz Brooks. “No final, será lembrado apenas pelo que fez de melhor, que estava atuando e cantando sua música como só ele poderia fazê-lo.” - Gregg Brooks.

“É difícil dizer em qual posição na hierarquia de artistas musicais Michael será situado”, diz Kirkham. “As pessoas achavam que ninguém poderia superar Elvis e aí os Beatles chegaram. Então, as pessoas pensavam que ninguém iria superar os Beatles. E então chegou Michael Jackson".


Tradução Selma Santi 

Fontes:


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